A ascensão da Inteligência Artificial (IA) traz consigo a possibilidade de uma grande transformação do cenário jurídico, com grande potencial para análise de processos judiciais, práticas advocatícias e, de acordo com notícias recentes, até mesmo auxiliar o tradicional papel dos magistrados ao proferir sentenças. Mas qual impacto do uso da IA com o desenvolvimento dos algoritmos no dia a dia da prática jurídica? 

Na advocacia, algoritmos e IA não substituem o trabalho intelectual, mas tem por finalidade aprimorar as capacidades humanas. É cada vez mais comum a utilização de ferramentas de pesquisa alimentadas por IA, que podem analisar jurisprudências e fornecer insights estratégicos. Contratos já podem ser revisados de forma eficiente, identificando cláusulas críticas e potenciais riscos. A colaboração entre advogados e tecnologias tornou-se essencial para maximizar a eficácia e a eficiência do trabalho jurídico.

Por outro lado, uma das maiores expectativas dos cidadãos que procuram o Poder Judiciário é obter a resolução do seu processo em um prazo razoável, e não demorar anos, e em alguns casos, até décadas. A utilização de IA na análise de processos e produção de sentenças judiciais pode corroborar para uma justiça mais rápida e imparcial, porque algoritmos podem analisar vastos conjuntos de dados, identificando padrões e precedentes de maneira mais rápida e eficiente, de modo a reduzir a carga sobre os juízes e tribunais, proporcionando decisões mais consistentes e coerentes. 

Mas, poderia a inteligência artificial elaborar uma decisão?

Com o desenvolvimento cada vez mais veloz da tecnologia e a inovação própria da  contemporaneidade, não há dúvida de que a inteligência artificial poderá se tornar mais do que uma simples ferramenta de auxílio ao profissional do Direito, inclusive elaborando sentenças através de análise de argumentos, tendo como referencial todo o arcabouço da ciência jurídica à sua disposição.

De certo, ainda há muitas variáveis para se chegar à tal conclusão, porém, já é possível vislumbrar as possibilidades que pode alcançar o desenvolvimento tecnológico, partindo de um raciocínio: não há limites aparentes nessa área, o crescimento exponencial e científico da tecnologia é fruto da infindável curiosidade humana.

Nessa linha de entendimento, sabe-se que uma sentença deve, sob pena de nulidade absoluta ou inexistência, ser proferida por juiz investido do poder jurisdicional, concursado, competente e imparcial.  Contudo, há exceção na lei com relação a isso, como se pode observar nas sentenças proferidas por juízes leigos nos juizados especiais cíveis, com posterior ratificação pelo juiz togado. Assim, há de se imaginar que a utilização de algoritmos para elaboração de uma sentença tem cabimento prático, porém, a necessidade de supervisão humana é fundamental para garantir a ética e a interpretação correta das nuances de cada processo.

Todavia, mesmo com a supervisão humana, a utilização de algoritmos no sistema jurídico ainda levanta algumas questões, especialmente relacionadas à transparência e ao viés algorítmico, que pode resultar em decisões discriminatórias e prejudicar grupos sociais específicos, de modo que a garantia da equidade e ao final, de justiça, ainda requer o desenvolvimento da transparência e a constante supervisão para evitar ou ao menos mitigar riscos de decisões enviesadas, deixando de ser imparciais.

O uso de robôs e inteligência artificial no campo jurídico, embora em estágio inicial no Brasil, traz a promessa de transformar a prestação dos serviços, seja pelos escritórios de advocacia, seja pelo órgão do Poder Judiciário. Note-se que hoje chatbots jurídicos podem oferecer informações básicas, facilitando o acesso à informação e à justiça. No entanto, ainda há de se levar em conta a complexidade das interações humanas, a fim de compreender a existência de casos com peculiaridades sensíveis, que exigem análise mais apurada.

À medida que abraçamos a era da IA no campo jurídico (em todas as suas áreas), torna-se também imperativo equilibrar a eficiência proporcionada pela tecnologia com a garantia da justiça e da ética. A simbiose entre humanos e algoritmos deve ser harmoniosa, e isso é essencial para enfrentar os desafios atuais e os que irão surgir decorrentes da nova formatação das relações humanas e tecnológicas. Assim, se as relações humanas já são complexas por si mesmas, conflitos de interesses as tornam ainda mais, por isso, a tecnologia deve ser pautada na simplificação, observando as novas nuances, e devemos estar preparados para isso.

Marco Aurélio F. Yamada

marcoyamada@mandaliti.com.br